Orai como se tudo dependesse de Deus, e trabalhai como se tudo dependesse de vós (Sto. Inácio de Loyola).

por Manuel Eduardo Iglesias S.J.

A vida de Inácio de Loyola sofreu uma mudança radical. Foi um convertido. O que ocasionou esta mudança? Em poucas palavras: ele passou a se sentir amado por Deus. Gratuita e misericordiosamente. Aconteceu em um breve intervalo de tempo. Uma ferida de guerra na perna o obrigou a parar durante vários meses. O ambiente de silêncio e a imobilidade forçosa permitiu-lhe pensar sobre a sua vida, seus sonhos e ambições. Dois livros abriram-lhe os olhos da alma e descobriu um mundo novo. Leu, em profundidade, a Vida de Cristo, no evangelho e na vida dos santos.

Uma vez convertido viveu no recolhimento da gruta de Manresa a experiência que marcou a sua vida e o tornou peregrino apaixonado do Reino. Recebeu uma ilustração na qual vislumbrou como toda a criação procede de Deus e como a ele retorna. Brotou nele o senso de reverência, característica da sua espiritualidade, que a podemos definir como a admirada e humilde contemplação do amor de Deus, sempre presente, atuante e querendo se doar e manifestar a nós em todas as coisas, situações e pessoas. Inácio contempla com os olhos da fé a Trindade, debruçada com amor de mãe sobre cada ser humano. Ele passou a se sentir amado por Deus em todo momento.

Sentiu-se criado com amor. Perdoado com amor. Chamado com amor. Enviado com amor. Acompanhado com amor. Os seus companheiros diriam que o pai Inácio parece ter Deus sempre diante dos olhos! E fez questão que a Ordem religiosa por ele fundada fosse chamada de Companhia de Jesus.

Um dos seus melhores amigos, padre Jerônimo Nadal, definiu Inácio como o contemplativo na ação; não só na oração. O próprio Inácio não cansa de repetir que a graça mais cobiçada é a de buscar e encontrar Deus em todas as coisas.

A sua espiritualidade está resumida no exercício que ele chamou de Contemplação para alcançar o Amor. Ele que media cada palavra pede a Deus a seguinte graça: Conhecimento interno de todos os benefícios recebidos para que, inteiramente reconhecendo-os, possamos em tudo amar e servir a sua divina Majestade.

Temos aqui uma grande verdade de incalculáveis consequências para uma vida cristã plena e contagiante. Só o amor de Deus, sentido e reconhecido, faz possível ao ser humano amar e servir a Deus e ao próximo. Inácio não separa oração e atividades que, para ele, são apenas meios para o fim desejado: encontrar Deus, alcançar o Amor. A palavra “encontrar” conota uma relação entre pessoas. E a palavra “amor”, Inácio a coloca mais em obras que em palavras e consiste na comunicação mútua do que as pessoas são e do que elas têm.

Santo Inácio foi um grande evangelizador e pedagogo espiritual. Deus é quem ama primeiro. Sendo assim, só quando nos sentimos amados por ele é que “podemos” amar. Esta experiência fez de Inácio um santo e um apóstolo.

Como a Igreja pode anunciar ao nosso mundo, em busca de luz e de amor, a grandíssima notícia de que cada pessoa é amada por Deus? Pais de família, catequistas, pregadores, missionários estamos todos chamados a ajudar as pessoas a se sentirem amadas e, nessa marcante experiência, encontrarem o rosto amoroso de Deus revelado em Jesus Cristo.

Alguém que fez os Exercícios espirituais recentemente me contou o bem que lhe fez ir lembrando-se durante o retiro das pessoas que a marcaram na sua vida e contemplar nelas os traços do amor de Deus.

Tive a satisfação de escrever um pequeno livro, Uma vida como Irmão jesuíta, sobre o santo Irmão José Martin Garro, falecido com 93 anos. Se tivesse de resumir numa frase a lição que mais me marcou no contato com ele, fico com a resposta que me deu quando lhe perguntei se tinha aprendido muito no seu contato com os pobres. Respondeu sem duvidar: Muito! Aprendi a amar a Deus e a ensinar a amar a Deus.

Ensinar a amar a Deus é mais do que falar de Deus. É ser um irmão que ama, acolhe, cuida e dá atenção aos outros no dia-a-dia. É isto que o Ir. Garro praticou, doando-se com aquele jeito tão simples, humilde e alegre. O seu amor precedia e acompanhava suas palavras. Suas obras é que davam credibilidade às suas palavras. Por isso, é que, quando ele falava de Jesus, tocava tanto as pessoas.

 

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